sexta-feira, 25 de março de 2022

         


              Recebemos constantemente perguntas sobre o melhor momento para fazer o desfralde das crianças. Como para este assunto não existe receita, escrevemos esse pequeno texto para ajudar a entender os sinais. Ainda mais importante que todas as informações, é observar cada criança amplamente, percebendo em que fase ela se encontra e o que ela já conquistou, tentando separar nossas expectativas e ansiedades de suas necessidades reais.

            O controle dos esfíncteres, tradicionalmente, é tratado como um condicionamento que parte da vontade do adulto. Quando a criança completa 2 anos, em muitos casos antes disso, o adulto toma a decisão de coloca-la no vaso sanitário e determina um tempo de espera em que, eventualmente, a criança fará ou não xixi ou cocô. Em algumas situações, a criança realmente faz e, então, o adulto mostra toda sua alegria e aprovação. Se a criança não o faz, o adulto mostra seu desapontamento. Existem muitos psicólogos, pedagogos e médicos que acreditam em condicionamento e treinamento: nesse sentido, nossa abordagem é completamente diferente da tradicional.

            Não é nosso objetivo que a criança tenha o controle dos esfíncteres o mais cedo possível, mas sim que este processo aconteça naturalmente, com calma e respeitando o tempo de cada criança. Não deve ser o adulto a querer que a criança tenha o controle dos esfíncteres, deve partir da criança a vontade, deve ser própria iniciativa. Para querer isso, ela precisa ter maturidade motora, emocional, dos músculos esfíncteres, do sistema nervoso, entre outras. O processo de retirada da fralda começa com a criança ainda usando fraldas. Isso inclui a criança ver o pai e a mãe indo ao banheiro, ter contato com outras crianças que utilizam o vaso sanitário e, principalmente, ter autonomia ao fazer seus cuidados. Ao trocar a fralda das crianças, devemos, em vez de distraí-las, incentivar para que participem ativamente, pedindo a sua ajuda em todos os momentos (para tirar a roupa, para se limpar, passar a pomada, colocar a fralda, etc.). Também é válido dizer frases como: - Vejo que você fez cocô / xixi / que sua fralda está seca. Aos poucos, a criança começa a perceber o que acontece em seu próprio corpo e dá sinais disso: ela mesma nos avisará que precisa ser trocada.

            Segundo a Abordagem Pikler, existem dois caminhos para o desfralde. O C.E. (controle dos esfíncteres) Ativo e o C.E. Passivo. No primeiro, é dado à criança o tempo que ela precisa para amadurecer fisicamente e emocionalmente. Quando esperamos o tempo da criança, ela rapidamente seguirá os passos abaixo, sem dificuldades e com alegria. No segundo, o adulto decide para a criança que ela está pronta e, assim, a criança assume uma postura passiva em relação ao processo. Quando feito dessa forma, tiramos dela a grande oportunidade de ter autonomia, vontade e o real sentimento de conquista.

           

C.E. ATIVO

- A criança reconhece a necessidade

- Consegue parar a brincadeira

- Vai ao banheiro

- Tira a roupa

- Faz o xixi ou cocô

- Veste-se

- Dá a descarga

- Lava as mãos

- Sai do banheiro O adulto deve/pode estar ao lado para ajudar, mas é a criança que avisa ao adulto que quer ir ao banheiro.

 

C. E. PASSIVO

- A criança passa o dia sem fralda, mas é o adulto que precisa lembra-la do xixi/cocô, leva-la ao banheiro e senta-la no vaso. O adulto passa o dia lembrando e perguntando à criança se ela quer ir ao banheiro.

 

 INDÍCIOS DE QUE A CRIANÇA ESTÁ PRONTA:

- Verbaliza a vontade de tirar a fralda, de usar calcinha/cueca

- A criança consegue vestir-se sozinha

- Refere-se a si mesma na primeira pessoa “eu”

- Dá sinais de que vai fazer cocô ou xixi, por vezes mostra-se incomodada, pede para ser trocada mesmo quando a fralda está limpa

- Mostra autonomia em tarefas diversas ligadas a sua rotina diária (item mais significativo).

            Por volta dos 3 anos, a criança começa a referir a si mesma usando a palavra “eu”, o que mostra uma primeira percepção de que há uma parte do mundo que sou “eu” e outra que não faz parte de mim, está fora, separada. Começamos a verificar uma primeira separação entre a criança e o mundo. Agora, a fralda suja passa a incomodá-la e ela solicita ao adulto que troque suas fraldas, mostrando que tomou consciência do que acontece em seu corpo. Aos poucos, começará a sentir o momento em que fará cocô e xixi. Após algum tempo desenvolvendo esta sensação, percebendo suas necessidades, estará pronta para o desfralde.

            Acreditamos que, quando uma criança é forçada a sentar no vaso antes de estar pronta, exigimos dela que exerça controle sobre um corpo ainda desconhecido, não completamente habitado. Por isso, é comum ver as crianças começarem a dizer “não” para outras situações, criando uma espécie de guerra em que passa a não colaborar com o adulto nas tarefas mais corriqueiras. Embora muitas crianças demonstrem êxito ao serem submetidas a treinamentos, preferimos partir do pressuposto de que, quando oferecemos um desafio em seu momento adequado, ou seja, sem acelerarmos os processos, temos a possibilidade de atuar em conjunto com a criança, a partir dela, das necessidades que se apresentam e de sua prontidão. Só com essa parceria podemos então substituir "treinamento" por "educação".

            Respeitando as conquistas que já fez e as conquistas que não fez, acreditando que as fará a seu modo e a seu tempo, garantimos que a criança se resolva. Quer dizer: não tomamos a decisão de que está na hora dela se sentar no vaso sanitário, deixamos que ela sinta seu corpo, perceba o que faz parte dele e o que não faz, deixamos que, naturalmente, surja a consciência do corpo e a vontade de estar no controle dele. Com paciência e confiança, a criança vence sozinha o desafio, guardando inconscientemente o sentimento de que é capaz.

            O processo do C.E. demora, em média, 9 meses desde o primeiro momento em que a criança mostrou interesse até o momento em que ela apresenta total controle. O desfralde começa com a criança mostrando algum interesse ou dando alguns sinais, mas isso não quer dizer que está na hora de tirar a fralda. Isso quer dizer que o processo começou. O adulto deve observar e esperar até que a criança determine, por iniciativa própria, que não precisa mais usar a fralda para suas necessidades. Quanto mais a criança está pronta para começar o desfralde no seu tempo, mais rápido e mais tranquilo será o processo, tanto para ela, quanto para seus pais.

            O processo do C.E. não é LINEAR e pode haver momentos de retrocesso. (recaídas). Devemos, então, dar um passo atrás e CONFIAR. Quando observamos que a criança não está pronta, está no processo passivo do C.E., devemos parar e dar um passo atrás (voltar a colocar a fralda). Porém, tal atitude não é recomendada, pois mostra à criança, através da decepção (mesmo que inconsciente) dos pais, que ela não foi capaz de concluir esta etapa. Isso faz com que ela fique com uma baixa autoestima neste quesito e pode ser que ela demore para confiar em si mesma novamente. Não devemos exigir mais da criança do que ela pode nos dar. Diversos problemas emocionais e físicos podem surgir na fase adolescente ou adulta de uma criança que não teve seu tempo respeitado durante esse processo.

            Quando fazemos “tentativas” de desfralde, não é natural. Quando precisamos levar a criança no banheiro a cada 5 minutos, não é natural. Quando os pais resolvem tirar a fralda, não é natural. Quando este processo ocorre naturalmente, a criança dá todos os sinais e ela, por conta própria, faz o desfralde, sem esforço de nenhum adulto. Vamos ter paciência e esperar nossas crianças, que são capazes e competentes! 

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